Democracia e Pluralidade de Opinião
2015/10/17 20:28
| Diário do Sul, Fazer Acontecer
| Link permanente
Tem vindo a travar-se por estes dias em França um interessante debate
sobre a paisagem mediática, designadamente no que diz respeito ao comentário
político, económico e social e à garantia da pluralidade na forma como ele é
praticado e difundido.
O debate parte duma constatação que poderá ser extrapolada para fora da
realidade francesa. Os “média” de massas, partindo da caracterização dos seus
públicos, privilegiam a opinião sensacionalista e provocadora à opinião mais
fundamentada e elaborada.
Em consequência, segundo estudos feitos em França, esse movimento tem
levado a uma predominância de comentadores da direita nacionalista e populista
no espaço mediático, em detrimento dos comentadores com uma visão progressista
e cosmopolita da realidade política.
No calor do debate surgiram mesmo mesmo acusações de reposicionamento político
de alguns dos mais mediáticos comentadores (filósofos, sociólogos, politólogos
e outros membros das elites académicas). Há quem acuse alguns desses
protagonistas de adaptarem o seu discurso àquilo que melhor vende na televisão
e nos grandes jornais de referência, em papel ou na rede, para se manterem à
tona da notoriedade e das audiências e preservarem a sua capacidade de
recrutamento de seguidores para as suas Escolas e projetos.
Obviamente este tema levanta problemas de análise de comportamentos e
de dinâmicas sociais, com grande complexidade e com validade muito para além da
realidade francesa.
A mudança de ideias e de perspetiva é um direito inalienável de cada
ser humano. Afirmar que alguém muda as suas ideias, não por alteração de
convicção, mas porque as novas ideias vendem mais e melhor, é um exercício que
carece de demonstração caso a caso, e que não pode e não deve ser generalizado.
Mas a questão merece ser vista de outros ângulos. Em França, como em
Portugal e na grande maioria dos países europeus, a linha editorial dos
principais órgãos de informação segue as pulsões das massas para garantir
audiências, publicidade ou contextos favoráveis aos seus acionistas. Pulsões em
que o nacionalismo populista vem ganhando espaço às visões cosmopolitas,
abertas e globais, como bem ilustra a questão dos refugiados e migrantes.
Nos Países (não é ainda a prática em Portugal) em que o Estatuto
Editorial define o posicionamento no espectro político de cada órgão de
comunicação social, é notória uma prevalência dos títulos e órgãos de
comunicação que se posicionam num registo conservador ou neoliberal, sobre aqueles
que se posicionam numa linha liberal e progressista. Estas tendências distorcem
o “mercado” das ideias. Os que pensam numa linha progressista tem menos janelas
para expressar o seu pensamento e o risco de espiral causa efeito é evidente.
No debate em França, que inspirou esta crónica, há protagonistas que
afirmam mesmo que se tiveram que “render” aos temas nacionalistas e populistas,
para os poder comentar numa linha progressista e com visão aberta.
Este debate deve fazer-nos refletir também em Portugal. A transparência
e a pluralidade de opinião nunca são demais em democracia.
Comentários