Calculismo
A não aprovação do Orçamento Geral do Estado para 2022 (OE) foi feita com plena legitimidade democrática e refletiu a vontade expressa pela maioria dos Deputados, sendo por isso mesmo um resultado incontestável do ponto de vista processual. Neste texto procedo à sua análise do ponto de vista do fundamento e dos argumentos,assumindo a subjetividade própria dos valores e princípios em que acredito.
Lamento que o arranque da recuperação do País após uma pandemia com um brutal impacto económico e social, tenha sido travada, com legitimidade como já referi, mas com absoluta inoportunidade, por uma crise política que se sabe como começou, mas que ainda é impossível antever como vai acabar.
A minha perspetiva não pretende ser sectária nem reveladora de mau perder. É o testemunho de uma convicção forte, com respeito total pela escolha feita e com o desejo sincero que no fim de todo o processo, havendo como é próprio da política, vencedores e vencidos, a maioria dos portugueses saia a ganhar.
Uma das críticas mais propaladas em relação a muitos representantes políticos, bastas vezes com justificação, é a de que são tentados a dar mais atenção àquilo que é mediático ou sonante do que á solução em concreto dos problemas das pessoas que os elegeram.
No caso da reprovação do OE e em particular no que se refere aos votos contra do Bloco de Esquerda (BE) e do Partido Comunista Português (PCP), que juntos ajudaram a inverter o ciclo político de austeridade e a retomar uma via de convergência e coesão,julgo que a motivação não foi resultado do conteúdo, tendo em conta as múltiplas propostas positivas para as pessoas e para o seu eleitorado mais específico que conquistaram ao longo da negociação, nem qualquer vã emergência de necessidade de protagonismo.
O que emergiu foi a aplicação dum frio calculismo em relação à liderança do espaço político que disputam. Sob a pressão da sobrevivência, a ideia forte de que as pessoas devem estar sempre primeiro, não conseguiu suplantar a força arrasadora do cálculo partidário.
Ao longo de 47 anos de democracia o povo português tem sempre demonstrado uma enorme sabedoria no momento de fazer as suas avaliações políticas através do voto, por muito que os seus vereditos e deliberações por vezes custem a aceitar, por quem não vê as suas opções maioritariamente sufragadas.
Mais cedo ou mais tarde será ao povo que caberá a ultima palavra sobre a apreciação democrática da crise espoletada pelo descaminho agora verificado. Agora o calculismo suplantou o caminho do compromisso. Em tempo o os eleitores dirão de sua justiça.